Poemas eróticos (fragmentos)
1
Esse sorriso que exalas,
traço impuro de promessas,
carrega tudo o que calas,
pássaro em vôo às avessas.
Com que véus se insinua
tua boca em clara malícia?
Não sei dizer: estás nua
quando ris, tornas delícia
o enigma destes momentos.
Qual o sentido que trazes
nos lábios quase sedentos?
Tua pele me dilacera
quando ardes num mistério:
e minha fome faz-se espera.
2
Há algo misterioso nos teus seios,
e busco em vão esclarecer seus halos.
Apelo às minhas mãos, não tenho meios
de descobrir o enigma sem tocá-los.
Disposto a encontrar algo que sele
minha curiosidade insaciável,
pesquiso a seda rósea da tua pele
com minha língua e sua palavra afável.
É madrugada. Mudo o meu caminho
e percorro o teu corpo como um pássaro
buscando a fome cálida no ninho.
Pergunto ao corpo, mas estás dormindo.
E mesmo assim minha sede é satisfeita
com essa resposta que me dás sorrindo.
3
Abri meus olhos: tudo se aqueceu
com a polpa clara, a pele doce seda.
Que minha saliva atrás do gineceu,
em recomeço eterno, me conceda
essa picante espera: ela promete
depor meu tédio diante da abertura
sem fundo, sem cancela, que submete
meu sonho a sua sensual brancura.
Minha boca se aproxima. Ela já sabe
o abismo suculento dessa esfera
na foz de uma nascente que a circunda.
Mato minha sede. Meu desejo cabe
inteiro onde só essa entrega impera:
alvo redondo que meu suco inunda.
(Renato Tapado)
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